“Para
quem já conhece a banda Ave Sangria, sabe que estou falando de um dos grandes
nomes do Rock nacional dos anos 70. Já para quem não conhece, fique sabendo que
eles já foram chamados de os Stones do Nordeste. Por aí já se tem uma ideia do
que estes 6 caras aprontaram na década de 70. Ainda com o nome de Tamarineira
Village, com visual extravagante, letras provocantes, fazendo uma fusão de Rock
com Baião, a banda chocava quem assistia seus shows. Não era comum usar cabelos
compridos, não só no nordeste mas em todo Brasil, mas os integrantes da banda
não estavam nem aí e procuravam cada vez mais formas de aterrorizar os coxinhas
da época.
Cansados
de explicar o significado do nome da banda para pessoas de fora de Pernambuco
(Village era a vila onde os integrantes moravam e Tamarineira o nome do bairro
assim como o nome do hospício local, logo Tamarineira Village era algo como a
vila dos loucos), trocaram o nome para Ave Sangria. Já sob a nova alcunha,
inventaram a história que o nome foi dado por uma cigana louca, que disse que
eles eram Aves Sangrias, onde a ave representava a liberdade que eles tinham
para cantar temas delicados para a época e sangria que representava o nordeste.
Depois
de conquistarem o nordeste, os integrantes Marco Polo (vocal), Ivson Wanderley
o Ivinho (guitarra), Paulo Raphael (guitarra), Almir de Oliveira (baixo),
Agricio Noya (percussão) e Israel Semente (bateria), galgaram novos voos para o
centro do país, sendo convidados pela gravadora Continental a gravarem seu
disco de estreia. E assim passaram 5 dias em um estúdio no Rio de Janeiro,
gravando o que seria o único registro oficial da banda até os dias atuais. Sem
nunca terem pisado em um estúdio de gravação e com o agravante de terem um produtor
que se perdeu no meio do turbilhão de sons que eles expeliam de seus
instrumentos, o grupo conseguiu colocar no disco somente uma parte de todo o
talento que os acompanhava nos palcos. Para completar a “desgraça”, a gravadora
não quis pagar pela arte do disco, feita pelo artista Lailson Cavalcanti,
simplesmente deram alguns trocados para alguém da própria gravadora fazer uma
cópia barata da arte original.
Mesmo
com todas as dificuldades, a música Seu Valdir chegou a décima primeira posição
entre as mais pedidas nas rádios, muito pouco tempo depois de seu lançamento.
Neste momento os ventos sopram mais uma vez contra a banda. A música, foi
considerada pela censura da época como uma apologia ao homossexualismo (se isso
ainda causa problemas hoje em dia, imagine em 1974?), a gravadora foi obrigada
a recolher os exemplares das lojas. Algum tempo depois o disco foi relançado,
já sem a faixa, mas “o tempo” da banda já tinha passado.
O
disco é uma obra em sua totalidade, entre os clássicos, destaco além da já
citada Seu Valdir, Geórgia a Carniceira, Dois navegantes, Corpo em Chamas a
mais rocker do disco e O Pirata, clássico da psicodelia dos anos 70 no Brasil.
Pouco tempo depois do lançamento, com contas para pagar e bocas para sustentar,
mas sem nenhuma previsão de terem retorno do trabalho, os integrantes partiram
cada um para seu lado. Boa parte foi fazer parte da banda de Alceu Valença.
Antes
porem, no final do ano de 1974, no Teatro Sta. Izabel, realizaram 2 shows nos
dias 28 e 29 de dezembro, não sei exatamente qual deles, mas um foi gravado em
fita de rolo e hoje é possível ouvir o show até mesmo no Youtube (mas continue
lendo a matéria que você saber uma novidade sobre este material).
Mas
eis que o advento da internet e a redescoberta de bandas até então
desconhecidas pelo grande público, resgata esta obra prima, e o disco é
digitalizado e espalhado na rede por blogs especializados em música dos anos
70. Assim, em 2011, a banda é convidada a fechar o já tradicional festival Psicodália
em Santa Catarina. Não sei dizer ao certo quem foi convidado da formação
original para tocar, mas 2 integrantes se despuseram a descer da caatinga do
nordeste brasileiro para tocar no sul do país, Marco Polo e Almir de Oliveira.
Mais uma vez a banda foi traída pelo destino. Pouco antes da apresentação,
Almir ficou doente e não pode viajar para o estado barriga verde, ainda sim,
mandou a mulher e o neto, ambos percussionistas para tocar junto com Marco.
Completando a turma estava a excelente banda Anjo Gabriel. Neste dia, este que
voz escreve estava presente no show, e o que posso relatar é que foi um show de
lavar a alma. Apesar de a sonoridade fugir um pouco do que foi registrado no
disco, a apresentação foi maravilhosa, e pode matar a “sede” de quem não viveu
o auge da banda. Recordo que em certo momento, Marco Polo comentou como era
engraçado, ver aquele pessoal todo cantando músicas que foram feitas quando a
maioria da plateia nem tinha nascido, com o agravante de nunca terem sido
relançadas em CD, somente em formato MP3 digitalizado do disco. A banda fez
quase dois shows, pois ao voltarem para o bis tocaram mais um monte de músicas.
A seguir pode conferir um pouco da energia do show.
Foram
lançados ainda alguns livros sobre a banda e sobre a cena musical nordestina da
época, um documentário que você pode assistir no vídeo a seguir, mas o disco
nunca teve a atenção que a obra merecia para ser relançado de forma digna.”
Jader Faust
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