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quarta-feira, 8 de agosto de 2012

KARINA BUHR


A baiana Karina Buhr tinha oito anos de idade quando começou a beber daquele caldo cultural enfeitiçado que só Recife (PE) tem. Dançou no balé popular da cidade, cantou e batucou nos maracatus Piaba de Ouro e Estrela Brilhante, nas bandas Véio Mangaba e Eddie e criou a Comadre Fulozinha com outras amigas em protesto ao predomínio masculino na música popular da região. E são todas essas Karinas --e algumas mais-- que aparecem sob a voz doce e a língua afiada da multiartista em seu primeiro trabalho solo, que será lançado oficialmente no sábado (27), no Sesc Pompeia (zona oeste de São Paulo).

"Eu Menti Pra Você" é um álbum com treze capítulos de fábulas e contos e sonhos e desejos tão independentes entre si que se tornam inseparáveis. "Tem muita música com tema diferente, uma fala de amor, outra de guerra, e nesse título cabe de tudo, a pessoa pode entender o que ela bem quiser", explica Karina.

Não à toa, ela abre o disco com a malemolente faixa-título, uma confissão desencanada, na letra e na levada --"Eu sou uma pessoa má/ Eu menti pra você", canta Karina dando de ombro. Da mesma forma, confessa uma vontade de não fazer nada na simpática canção "Plástico Bolha", canção que encerra o álbum. Do começo ao fim, tudo é muito bem amarrado e trilhado por Bruno Buarque (bateria e MPC), Mau (baixo), Guizado (trompete), Dustan Gallas (teclados e piano), Otávio Ortega (teclados e bases eletrônicas), Marcelo Jeneci (acordeon e piano) e Edgard Scandurra e Catatau (guitarras).

No meio de tanta malemolência há os esbravejos, ardidos e doces como sua voz, capazes de provocar um certo desconcerto. "Dorme logo antes que você morra, está chovendo fogo e as ruas estão queimando" é o refrão desesperado de "Nassira e Najaf", uma das músicas bélicas de "Eu Menti Pra Você". "Logo que começou a guerra no Iraque eu passei a acompanhar tudo e fiquei bastante desesperada com a história toda. Teve um dia que eu estava assistindo ao jornal e vi a notícia de que essas duas cidades, Nassira e Najaf, tinham sido bombardeadas, e foram nesses lugares onde mais morreram crianças. Essa notícia ficou se repetindo, e eu vendo aquelas imagens, fiz essa música".

Outro registro bélico, a faixa "Soldat", Karina fez pensando em seu tio-avô e na história de guerra da parte alemã de sua família. "Ele teve que ir para a Segunda Guerra aos 16 anos, na época que só sobraram os velhos e as crianças. E ele morreu ano passado, aos 82 anos, super lúcido. É uma história bem louca", lembra.

As raízes alemãs vêm à tona também em "Telekphone", uma conversa "meio surreal" em alemão por telefone, que conta com a participação da atriz alemã Juliane Elting, com quem trabalhou no Teatro Oficina, de Zé Celso.

O teatro, o novo começo

Pois é, teatro. Em 1999, Zé Celso levou duas de suas peças para um festival de teatro de Recife. Entre um espetáculo e outro, foi ao show de Comadre Fulozinha e gostou de Karina. "Quando acabou o show, ele veio falar comigo e me convidou para atuar em 'Bacantes'", conta. "Foi bem emocionante para mim porque eu sempre quis ser atriz, mas nunca corri atrás disso. O balé popular tinha muita coisa de teatro, na banda Véio Mangaba tinha o pastoril. Esse era meu teatro, na verdade".

Entre idas e vindas à capital paulista para as empreitadas de Zé Celso, ela decidiu se fixar de vez na cidade em 2004, quando já tinha engatado uma jornada que duraria cinco anos no Teatro Oficina. "Nessa época eu pensava em lançar o trabalho solo, mas eu não tinha muito tempo para pensar nisso. Tinha música que eu escrevia e guardava. Depois que 'Os Sertões' acabou, eu quis sair e viver essa história".

Ah, Karina também desenha. A veia artística da cantora também se ramifica para as artes plásticas. Autora das ilustrações do encarte de seu CD e das capas de Comadre Fulozinha, ela até começou um curso de educação artística, mas diz que ficava mais no bar do que na sala de aula. "Só serviu para fazer um monte de amigo legal, minha universidade mesmo foi a rua, o maracatu".

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